Outro dia escrevi do meu avô, imigrante espanhol e cujo
primeiro emprego foi ser carvoeiro, chegando exclusivamente pelo árduo trabalho,
a ser um dos maiores latifundiários do Brasil.
Nos dias seguintes tive uma torrente de lembranças dele, do
meu pai, da minha mãe e especialmente da minha avó materna Rosa de Andrade
Pacheco.
Dona Rosinha como era chamada, teve quinze filhos, dos quais
doze sobreviveram. Acho que foi um recorde para a época onde a mortalidade
infantil era enorme. Minha mãe filha mais velha, tem hoje 92 anos de idade e
vários tios e tias estão vivos.
Dona Rosinha era quase venerada por todos que a conheciam.
Depois do segundo ou terceiro incêndio que destruiu a marcenaria do meu avô,
deixando-o depressivo e praticamente inabilitado para o trabalho, arregaçou as
mangas e com forças tiradas de não sei
onde, transformou a casa onde morava e outra que herdara da mãe, em casas de
cômodos, as quais alguns mal educados e deselegantes chamavam na época de
cortiços.
Com a renda dos aluguéis sustentou e formou todos os filhos,
tendo como peculiaridade a formação musical da maioria no Conservatório Musical
e Dramático de São Paulo, coisa que não era para muitos na época.
Não eram tempos fáceis como me
contou minha mãe, mas a vó Rosinha
conseguiu agregar toda a família e a sua casa era o porto seguro, o lugar onde
mesmo depois de casados, filhos, filhas e netos se reuniam em almoços, festas
de aniversario e especialmente no Natal, na Rua Sergipe 248, endereço nobre em Higienópolis, casa que ela
comprou depois que as coisas melhoraram e ela ficou até bem de vida, tendo
reformado e transformado o casarão imenso num belo palacete.
Cheguei a morar com a vó Rosinha por uns seis meses porque
minha mãe, acometida por uma nefrite, ficou imóvel na cama, e essa lhes pareceu
a melhor solução, uma vez que eu estudava no Colégio Rio Branco, apenas três ou
quatro quadras da casa da vó.
Depois que meu avô morreu e ele morreu cedo, acho que com uns
cinquenta anos, minha vó e as filhas mantiveram um longo luto, vestindo-se de
preto por pelo menos um ano, como era costume na época. Eu tinha quatorze anos.
Terminado o luto, e é dessa época que eu me lembro. A casa
estava sempre em festa, abastecida de comida e cheia de visitas. Familiares e amigos e amigas dos filhos vinham visitar a Dona Rosinha com um carinho
memorável, uma vez que ela participou ativamente na formação de todos e a todos
dava conselhos, atenção e carinho.
Dona Rosinha morreu cercada da família que criou e manteve
agregada. A família amparou-a na velhice e até que o casarão da Rua Sergipe
desse lugar a um luxuoso prédio, a família ainda se reuniu lá por um tempo.
Tenho saudades da lembrança do que é uma família grande e unida,
coisa que hoje em dia pouco se vê.